O PSDB faz nesta sexta-feira (31) sua convenção nacional, em que o ex-deputado federal Bruno Araújo (PE), que foi também ministro das Cidades na gestão de Michel Temer, deve ser escolhido como novo presidente da legenda. Ele vai ocupar o cargo que atualmente é do ex-governador paulista Geraldo Alckmin.
Além de eleger Araújo, a convenção vai sacramentar o controle do atual governador de São Paulo, João Doria, sobre o partido. Recentemente, Doria disse que estava à frente da construção de um “novo PSDB” e que os que não concordassem com o momento futuro da sigla deveriam ter “grandeza de defender seus interesses fora” da legenda. A fala foi interpretada como uma crítica aos setores tucanos mais conectados com a esquerda.
O atual governador saiu fortalecido após vencer a apertada disputa eleitoral contra Márcio França (PSB), no ano passado. Em um ano em que o PSDB colecionou derrotas nas urnas, a vitória posicionou Doria como o nome mais expressivo do partido e deu a ele a “natural” condição de presidenciável para 2022.
“O fato de ele estar presente nesta articulação para o comando do partido é uma demonstração clara que nós do PSDB o temos como uma grande liderança para o futuro”, disse o deputado federal Vanderlei Macris (PSDB-SP). Também representante do partido na Câmara, Rodrigo de Castro (MG) endossou: “ele é um nome que tem perspectiva para a próxima eleição presidencial”.
Doria chegou a ser cogitado como presidenciável do PSDB ainda para as eleições de 2018, quando era prefeito de São Paulo. A motivação para a especulação em torno do seu nome foi a expressiva votação que recebeu em 2016 e também a aprovação popular do início de seu mandato.
O partido acabou optando por Alckmin na corrida para o Planalto, e Doria disputou o governo de São Paulo – no percurso, foi acusado por apoiadores do ex-governador de não se empenhar no projeto presidencial do PSDB. Assim que o primeiro turno das eleições terminou, Doria procurou colar seu nome com o do então candidato Jair Bolsonaro e emplacou o termo “bolsodoria”.
Recentemente, entretanto, o governador buscou se mostrar diferente do presidente da República, exibindo contrariedade em temas como a celebração do golpe militar de 1964.
Na convenção, o PSDB renovará, além do presidente, sua Comissão Executiva. Serão ainda avaliadas modificações no estatuto da legenda e no código de ética e disciplina, além de regras de “compliance”. “Nós queremos que o partido possa resgatar temas da social-democracia. Há muitos jovens ocupando espaço, e isso é algo que tem a cara do nosso partido”, defendeu a deputada federal Mariana Carvalho (PSDB-RO).
Quem é Bruno Araújo?
O provável novo presidente do PSDB tem 47 anos e nasceu em Pernambuco – será, assim, o segundo político de seu estado a comandar a legenda. Antes, Sérgio Guerra foi presidente do PSDB entre 2007 e 2013.
Araújo foi deputado estadual por dois mandatos e chegou ao Congresso Nacional em 2007. Liderou a bancada do PSDB na Câmara em 2012. Ganhou notoriedade em 2016, quando deu o voto decisivo para a aprovação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Logo que Michel Temer chegou ao Planalto, foi convidado para o Ministério das Cidades e ficou na função até dezembro de 2017. Deixou o cargo em um momento em que o PSDB discutia se permaneceria compondo ou não a gestão Temer.
Em 2018, Araújo tentou se eleger senador por Pernambuco. A empreitada não foi bem-sucedida: ele ficou apenas na quarta colocação, com cerca de 14% dos votos.
Seu nome é especulado para o comando do PSDB desde o fim do ano passado, após o fracasso eleitoral de Geraldo Alckmin na corrida presidencial. À época, o diagnóstico do partido era o de que o ex-governador paulista havia falhado também no controle da legenda e que era o momento de um novo nome, com um novo discurso.
Araújo sinalizou adesão a uma pauta mais conservadora, defendendo temas como a redução da maioridade penal. Com isso, o ex-deputado acenava a uma corrente do eleitorado que chegara ao PSDB nos tempos em que o partido representava a principal oposição ao PT, mas desagradava lideranças históricas da sigla, que foi fundada com um discurso de centro-esquerda.
Juntando os cacos
A tarefa de Araújo e Doria de fazer um “novo PSDB” será árdua. O partido foi um dos principais derrotados das eleições de 2018. O candidato tucano à Presidência ficou apenas em quarto lugar, com menos de 5% dos votos válidos – mesmo contando com o maior tempo de TV e com o apoio formal de partidos do chamado “Centrão”.
A legenda elegeu 29 deputados federais, contra os 54 de 2014. Houve também retrocesso no número de governadores eleitos: dos cinco em 2014, os tucanos passaram a três em 2018. Além de Doria, venceram as disputas estaduais pelo PSDB Reinaldo Azambuja (MS) e Eduardo Leite (RS).
O mau desempenho em 2018 é admitido pelos tucanos e citado como referência de um desafio a ser superado. “O partido está muito consciente do resultado eleitoral da última eleição, onde nós tivemos muita dificuldade de apresentar uma proposta que pudesse sensibilizar a sociedade brasileira. Uma eleição onde o partido não teve condições de aquilatar o que estava acontecendo na sociedade para viabilizar uma proposta”, afirmou o deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP).
A falta de uma “identidade” na postura do PSDB é algo que tem sido citado por tucanos e opositores como algo a ser corrigido dentro da legenda. O partido tem nomes que defendem bandeiras do bolsonarismo e também opositores do presidente da República.
Em Minas Gerais, estado que o partido administrou entre 2003 e 2014, os tucanos fizeram uma convenção no último dia 4 em que prevaleceram as críticas ao governador Romeu Zema (Novo) – mesmo com o PSDB tendo o líder do governo na Assembleia Legislativa e um secretário de Estado.
A consolidação do partido Novo e a ascensão do PSL após a entrada de Bolsonaro na sigla marcam também o momento ruim do PSDB. Os “novos” partidos cooptaram lideranças políticas que antes aderiam ao PSDB por ver no tucanato o maior expoente do anti-petismo. O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), foi eleito pelo PSDB em duas ocasiões.
“O PSDB é um partido sem norte, sem referência. E isso não vem de hoje: começou no governo de Fernando Henrique, quando eles adotaram uma agenda liberal e de direita. Mas tinham vergonha de se assumir assim. Quando aparecem novas forças políticas que não têm essa vergonha, que se apresentam dessa forma sem ressalvas, o PSDB se esvazia”, opinou o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG).
Um sopro de relevância para o partido veio com a recente indicação do deputado Samuel Moreira (SP) para ser o relator da reforma da Previdência na comissão especial da Câmara que avalia o tema. A pauta é a mais importante para a equipe econômica do governo e o trabalho de Moreira tem sido elogiado até mesmo por opositores do PSDB.
Controvérsias internas
Mais do que “identidade” e diálogo com o eleitor, porém, o PSDB foi afetado por escândalos de corrupção que atingiram em cheio o partido nos últimos anos.
Dois alvos foram os ex-governadores Beto Richa (Paraná) e Marconi Perillo (Goiás). Ambos haviam sido eleitos e reeleitos em seus estados. Mas em 2018 foram acusados de corrupção ao longo do período eleitoral e perderam eleições para o Senado em que tinham a vitória dada como certa.
O partido ainda lida com as controvérsias envolvendo o hoje deputado federal Aécio Neves (MG), que foi governador, senador, presidenciável e por muito tempo a principal estrela tucana. Aécio tornou-se uma dor de cabeça para o PSDB e teve, na última terça-feira (28), R$ 128 milhões bloqueados pela Justiça por conta de suspeitas de que teria recebido propinas do grupo J&F.
Após ter passado perto da vitória na eleição presidencial de 2014, Aécio viu sua carreira política decair após a divulgação, em 2017, de conversa que ele teve com o empresário Joesley Batista, em que pediu R$ 2 milhões.
Refundação?
Em meio a crises e poucos votos, o PSDB reconsiderou uma alternativa rotineiramente aventada por outras legendas: a “refundação”, com mudança de nome ou mesmo a fusão com outro partido. A alteração na denominação foi sugerida pelo governador João Doria, que disse ter planos para discutir o tema a fundo a partir de junho.
Já a fusão teria como parceiro o DEM, de quem o PSDB é próximo desde 1994, quando Fernando Henrique Cardoso foi candidato a presidente da República pela primeira vez. A hipótese, entretanto, foi rechaçada pelos democratas – “não há hipótese”, disse o presidente do DEM, o prefeito de Salvador ACM Neto.
O DEM vive atualmente seu maior momento desde o início das gestões do PT: o partido tem as presidências de Câmara e Senado e três ministérios no governo Bolsonaro (Saúde, Casa Civil e Agricultura). Há, inclusive, boatos de que a família Bolsonaro possa migrar para lá no futuro.